Várias
investigações, consideram como tarefa primordial da adolescência, a passagem
progressiva das relações com as figuras parentais, para as relações com os
pares e a integração do adolescente no
grupo, servindo estas, de função de vinculação. Se na infância as figuras de
vinculação mais significativas tendem a ser os adultos, já na adolescência,
estas passam a ser os pares.
Bowlby e Ainsworth encaram a
vinculação na adolescência como uma transição entre as vinculações da infância
e da idade adulta, período em que as relações afetivas vão para além das
relações familiares. Ainda que não tenha trabalhado diretamente esta
problemática, o autor apresenta uma perspetiva de continuidade e congruência do
comportamento de vinculação, ao longo do ciclo de vida, em que os padrões
adquiridos na infância, tendem a ser estáveis no tempo, contribuindo a
manutenção do comportamento parental, dos cuidados prestados e ainda a
resistência à mudança dos modelos representacionais de vinculação que tendem à
autoperpetuação. Refere ainda, que nos indivíduos normais há comportamentos de
procura de segurança e de exploração do ambiente, que surgem alternadamente ao
longo do ciclo vital, de acordo com diversos contextos.
Fleming
concluiu do seu estudo sobre a adolescência e autonomia, que a capacidade do
jovem se autonomizar, está na dependência não só da sua perceção de ter pais
que encorajem a sua autonomia, mas também, da qualidade do vínculo que os liga.
A autonomia é fomentada pelas atitudes parentais, conjugadas a uma definição
clara de limites e regras para o comportamento, e uma relação calorosa e de
aceitação. Refere ainda, que, um estilo democrático de controle parental se
associa a uma maior autonomia no jovem; pelo contrário, pais autoritários ou
muito permissivos têm, com grande frequência, filhos com baixa autoconfiança,
dependentes ou revoltados. Assim, quanto mais os pais forem percecionados como
figuras promovendo a autonomia, mais estes funcionam como modelos
identificatórios válidos, sendo eles próprios adultos autónomos, e mais
valorizarão e reconhecerão a necessidade destes se autonomizarem (ao que parece
o encorajamento da autonomia por parte dos pais proporciona e estimula os
movimentos exploratórios, a experimentação, o confronto com situações de
frustração ou de insucesso, estimulando também a gratificação e satisfação
conseguida pela realização de tarefas sem a ajuda parental). No que respeita à
qualidade emocional do vínculo com os pais, se a emoção básica for o amor, o
jovem progride na sua capacidade de se autonomizar; se a emoção básica for a
hostilidade, o jovem não encontra uma base segura, a partir da qual pode levar
a cabo o processo de separação e fracassar na tarefa desenvolvimental de
autonomia.
Para Bowlby
a autoconfiança e consequentemente a autonomia, não é tanto “contar consigo
próprio” mas contar com o apoio dos outros, para a partir daí, construir a sua
própria autonomia. Na sua opinião, e também a de Soares, uma autoconfiança bem
fundada, não só é compatível com a capacidade para contar com os outros, mas
cresce com ela e é sua complementar.
Nesta
perspetiva, se por um lado, a vinculação é um laço que promove comportamentos
de exploração e autonomia no adolescente, surgindo as amizades com os pares,
como um importante contexto para o desenvolvimento social deste; por outro
lado, as relações e as vivências com os pares e outros adultos significativos,
ajudam no processo de separação/individuação, permitindo em simultâneo, a manutenção
de fortes laços vinculativos aos pais e a autonomia.
Hartup defende
a ideia que o sucesso, segundo o qual as crianças adolescentes e os jovens
acompanham com os seus contemporâneos, constitui um dos melhores preditores da
adaptação adulta; os jovens que estão geralmente deprimidos e agressivos e que
apresentam problemas de comportamento, estão do ponto de vista
desenvolvimental, em risco.
Num estudo
realizado por Paixão através de entrevistas exploratórias, chegou à conclusão
que na adolescência e na juventude, os grupos de pares oferecem outras
representações familiares de cada um dos componentes do grupo, possibilitando
enriquecimentos mútuos à personalidade de cada um. O jovem ensaia-se nos outros
e com os outros, sendo o grupo, portanto, o lugar de experimentação de novas
entidades, permitindo assim, ver de fora a família, rever e interiorizar
definitivamente a sua representação e a do seu autoconceito.
Numa
apreciação da literatura sobre o desenvolvimento psicológico e a perceção dos
jovens sobre o seu relacionamento com os pais, em termos de vinculação e
autonomia, Soares destacou que a vinculação dos jovens aos pais está
positivamente correlacionada com a autoestima e com índices mais gerais
relativos ao funcionamento interpessoal e à adaptação social.
Também
Armsden evidenciou num estudo sobre a qualidade da vinculação na adolescência,
que, relativamente aos pais, esta está positivamente correlacionada com a autoestima.
Kobak relaciona-a
com índices mais gerais no funcionamento interpessoal e competência social,
defendendo a ideia que o curso do desenvolvimentos da vinculação parece
mover-se da dependência da presença da figura de vinculação na infância
(geralmente os pais), caminhando para uma relativa autonomia, dessas mesmas
figuras, durante a adolescência, mas ficando de reserva as figuras de
vinculação inicial. Estas servem assim de base segura de onde se parte para uma
exploração de meio, passando pela proximidade/afastamento dos pais. Da mesma opinião
é Soares, designando de “figuras de vinculação de reserva”, pelo facto dos pais
constituírem recursos disponíveis para o adolescente, quando este é confrontado
com situações de stress.
Kobak e
Sceery afirmam que, ainda que muito do tempo do adolescente seja passado sem os
pais, a explorar e a estabelecer novas relações com os pares, a maioria dos
adolescentes não pretende com isso separar-se deles e pôr em causa a sua
relação ou a serem forçados a uma escolha entre eles. Segundo estes autores é
de esperar que a qualidade das relações com os pares esteja intimamente ligada
à acessibilidade dos pais como figuras de vinculação na reserva durante a
adolescência. Assim, espera-se que o adolescente seguro deve ser bem sucedido,
quer na negociação das mudanças na relação pais-criança, quer na exploração e
no desenvolvimento de relações de confiança com os pares que possam vir a
incluir uma componente de vinculação.
Na medida
em que, a qualidade das relações com os pares parece estar relacionada com a
qualidade da representação dos modelos das figuras de vinculação, pode
acontecer que as novas relações extrafamiliares venham a constituir um contexto
facilitador para a mudança dos modelos mais precoces. Neste caso a revisão dos
modelos pode então ser vista como uma forma de acomodação, na qual, as
expectativas existentes mudam de acordo com a nova informação. Esta revisão ou
mudança nos modelos representacionais durante o desenvolvimento do adolescente,
poderá ter uma influência significativa, na segurança do jovem adulto.
Para Weiss um
aspeto importante da vinculação do adolescente com os pares é a capacidade
destes em suportar e encorajar os desafios do indivíduo, promotores do seu
desenvolvimento. O desenvolvimento da vinculação move-se da dependência da
figura de vinculação na infância para uma relativamente autonomia dessa figura
na adolescência. Nesta estruturação da relação, há uma potencial rutura na
compreensão e entendimento entre pais e filhos. A renegociação da relação deve
refletir o equilíbrio entre a expressão da autonomia ou da individualidade e a
expressão da ligação torna-se fundamental.
“Para o
adolescente é a oportunidade de estabelecer novas relações, particularmente com
os pares, que poderá constituir uma relação significativa para reavaliar as
vinculações precoces, nomeadamente nas vinculações inseguras. Dado que, se
desenvolve a intimidade na relação com os amigos, é possível que estas relações
possam introduzir uma descontinuidade no percurso desenvolvimental do sujeito,
exigindo a reavaliação e reestruturação da relação do adolescente com os pais”.
Embora os
pais deixem de ser figuras centrais e únicas na vida do indivíduo, à medida que
este passa da infância para a adolescência, eles continuam, no entanto, a serem
figuras de vinculação. Soares e Campos referem-se a investigações realizadas
nesta área, que apresentaram dados curiosos quanto à intensidade da vinculação
do adolescente aos pais: os adolescentes descrevem-se como estando agora afetivamente
mais próximos dos pais do que antes da saída de casa ou mesmo em qualquer outro
período do desenvolvimento. Consideram-se também mais responsáveis e autónomos.
Este resultado tem sido interpretado como um indicador de mudança de natureza
subjetiva na relação do adolescente com os pais; mudança essa, julgada
necessária para o próprio processo de separação do adolescente, já que o jovem
necessita de percecionar a sua relação com os pais como mais próxima ao nível
emocional, de modo a enfrentar com segurança e bem-estar o processo de
separação da família.
Se o
adolescente renuncia aos seus pais como figuras de vinculação primárias, a sua
adaptação ficará dependente do sucesso no estabelecimento de relações com os
pares, conforme defende Machado. Quando as relações com os pares não satisfazem
adequadamente as necessidades de conforto e suporte do jovem, este experiência
a solidão. Segundo Weiss, a solidão pode ser considerada uma forma de angústia
de separação, experienciada com maior frequência e sentida mais intensamente.
Enquanto que, a angústia de separação pode ser diminuída pela reunião com a
figura de vinculação, na juventude há o reconhecimento de que os pais não podem
continuar a serem fonte primária de conforto e suporte (Kobak e Sceery). Nesta
situação, a solidão é uma forma de angústia de separação, que não pode ser
terminada com a reunião com os pais, mas unicamente através do desenvolvimento
de ligações afetivas adultas com os pares.
Vários
autores em diversos estudos, correlacionam positivamente a qualidade da
vinculação na adolescência a outros conceitos, nomeadamente, com o suporte social
(McCormick e Kennedy), com a competência social entre pares (Cooper e Carlson).
Mais recentemente, alguns estudos têm também procurado relacionar os estilos de
vinculação e as relações amorosas na idade adulta, como é o caso de Bartholomew
e Horowitz, Collins e Read, Hazen e Shaver.
Sofia Almeida
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